25/07/2009

Novas perspectivas para o Ensino Português na Califórnia III

É preciso uma aldeia para educar uma criança | It takes a village to raise a child


Esta frase tem-se tornado cada vez mais popular entre aqueles que acreditam que a educação das novas gerações, ontem como hoje, não é só um dever dos pais, da escola, da igreja, ou do estado, mas sim uma tarefa colaborativa e uma responsabilidade que vincula a sociedade em geral. Olhada deste modo, a educação diz respeito a todos, tenham ou não filhos e netos a estudar. Todos somos educadores, todos podemos participar, todos podemos fazer a diferença no desenvolvimento das nossas crianças e jovens. Ou pelo menos podemos tentar.

No caso do Ensino Português a aceitação consciente deste desafio social e cívico torna-se ainda mais necessária e evidente. Penso não ser novidade nenhuma afirmar que a utilização e o conhecimento da língua portuguesa está em declínio na Califórnia. A continuar o actual estado de coisas, o Português como língua de comunicação e intercâmbio nas famílias, nas associações, no mercado de trabalho morrerá com o desaparecimento progressivo das gerações mais velhas. De quem é a culpa? A culpa não é de ninguém em particular, mas é de todos em geral.

Por um lado, existem forças poderosas em actuação na sociedade americana (como aliás em outras sociedades multi-étnicas) que podem constituir sérios obstáculos à sobrevivência de uma língua e cultura minoritária como o Português. Todas as minorias sentem a pressão da aculturação e da assimilação e esta luta é geralmente ganha pela tendência maioritária (main stream) em apenas 3 gerações - os netos dos imigrantes já não falam (pelo menos com a fluência desejável) a língua dos seus avós. Por outro lado, mesmo aqueles que tentam resistir a essa perda das raízes e da identidade, sentem muitas vezes baldados os seus esforços quando os jovens a elas renunciam de tão boa vontade, inconscientes do seu empobrecimento linguístico e cultural.

No entanto, o apagamento progressivo das línguas de imigração não está escrito nas estrelas, não faz parte de um destino amaldiçoado, nem é uma perda irreparável. Tal como acontece em muitos lugares do mundo (e Portugal é cada vez mais um deles) existem sociedades em que se fala mais do que uma língua, acontecendo que estas podem ter igual estatuto enquanto línguas oficiais (na Europa, o caso da Suíça é paradigmático). A coexistência de várias línguas na sociedade e nos indivíduos que a constituem implica uma ordem de conceitos diferentes da assimilação forçada, tais como o respeito e o gosto pela individualidade e a diferença, a crença no grande poder de aprendizagem da mente humana e a possibilidade de cada um poder assumir vários papéis, ter diferentes grupos de pertença e transitar de uns para outros sem prejuízo da sua auto-imagem.


Dos 16 anos que já levo de conhecimento das comunidades luso-descendentes da Califórnia, e procurando eu mesma o equilíbrio entre as duas línguas e culturas a que mais sou exposta, penso não errar muito ao afirmar que existe entre os educadores (principalmente pais e professores) um grande desconhecimento das possibilidades que ainda nos restam para contrariar a inércia linguística presente, de tendência monolingue com predominância do Inglês. Por exemplo, quantas vezes observo que estando dois adultos de origem portuguesa conversando na sua língua, logo que se dirigem a uma criança ou jovem mudam para Inglês sem reparar ou, falando com a criança ainda em Português, logo traduzem para Inglês. Porque razão tendem as pessoas a falar em Inglês com o meu filho quando ele foi criado em Portugal? Será por pensarem que após 2 anos na escola americana ele já devia ter perdido a sua língua materna? Mas o caso mais espantoso para mim é, isso sim, a capacidade que muitos já adquiriram de na mesma frase dizerem palavras alternadas em Português e Inglês, com uma fluência invejável naquilo a que se costuma chamar portinglês.


Para alterar estas situações teremos de conhecer alternativas, fazer conjuntamente um esforço consciente para não perder as oportunidades que ainda se oferecem e contrariar maus hábitos adquiridos. A sobrevivência de qualquer língua reside em dois simples princípios que se reforçam mutuamente: a motivação dos falantes para a sua aprendizagem e a ocasião para o seu uso. Motivar e utilizar. Quanto maior motivação, maior utilização e vice-versa.


Encontrar estratégias individuais, familiares e comunitárias para a sobrevivência do Português na Califórnia é na verdade o grande desafio enfrentado pelo Ensino Português. Embora as políticas de língua pensadas em Sacramento ou Lisboa possam vir a contribuir ou facilitar a permanência e a expansão do Português no sistema de ensino na Califórnia, dificilmente Portugal pode criar mais cursos nas escolas públicas deste estado, cuja ausência se criticava num artigo recente do jornal Emigrante/Mundo Português. Essa tarefa só pode caber às próprias comunidades, grupos de pais e educadores que, agindo directamente junto dos distritos escolares das suas áreas de residência, peçam a criação de opções de Português. Mas para isso também será preciso formar uma nova geração de professores que queiram assegurar o futuro de novos programas, para além de se conseguirem os fundos que permitam o seu desenvolvimento. Em suma: Advocacia, Formação de Professores, Investimento no Ensino Português.


É minha convicção de que as comunidades luso-americanas na Califórnia estão realmente interessadas em assegurar a continuidade da sua herança linguística e cultural (e uma não vive sem a outra) e integrar por direito a comunidade mais vasta do mundo lusófono. E acredito que estão preparadas para enfrentar esse desafio com os seus próprios meios, encontrando parceiros e colaboradores para os seus projectos locais e regionais. Nesse sentido a Coordenação do Ensino Português propõe para este próximo ano lectivo de 2009/2010 três princípios estratégicos que vão guiar os seus projectos de desenvolvimento. São esses princípios:

I. PARCERIA

A CEP.CA define-se como parceira natural de várias instituições no contexto educativo na Califórnia, apoiando escolas, professores, alunos e famílias, incluindo a atribuição de bolsas e ofertas de material de ensino e cultura. No entanto, não possui um estatuto legal no contexto americano que lhe permita actuar como entidade pública e potenciar o seu investimento no Ensino Português (EP).

A formalização de parcerias com instituições educativas luso-americanas para fins não lucrativos, permitir-lhe-á realizar projectos que envolvem a angariação, gestão e distribuição de contribuições monetárias por parte de indivíduos e organizações, aplicáveis directamente em programas de EP (dedutíveis no IRS). Ou seja, o investimento directo que Portugal faz no EP na Califórnia através da Coordenação, pode ser melhor rentabilizado e reforçado pelo envolvimento das comunidades e instituições locais, as quais, ao tornarem-se parceiras da CEP.CA, tornam-se, simultaneamente, co-responsáveis na sua acção.

Em Setembro de 2009 será lançado o projecto ADOPT-A-PORTUGUESE-SCHOOL ao qual as escolas, professores e alunos poderão candidatar-se através da apresentação de projectos de desenvolvimento e formação. Por seu lado, todos os indivíduos, associações, empresas, etc. interessados em apoiar directamente o EP poderão fazer uma contribuição (desde $5) para um programa ou escola da sua eleição, que passam a adoptar. No final do ano lectivo será contabilizado o investimento total efectuado pela CEP.CA e pelas comunidades no EP, serão publicados os resultados e publicamente distinguidos os 3 mecenas mais generosos.

II. PROMOÇÃO

No momento em que Portugal desenvolve uma campanha de renovação da sua imagem no mundo, promovendo o talento nacional e procurando dar a conhecer o seu carácter distintivo, são de aproveitar essas sinergias em todos os contextos onde se promove a lusofonia. Tanto as populações luso-descendentes, como a sociedade americana no geral, desconhecem muitas destas novas perspectivas sobre Portugal e os portugueses.

As escolas, os professores e as famílias podem conjuntamente desenvolver e promover o talento local numa perspectiva de integração global. Deste modo, a promoção do bilinguismo activo e equilibrado (Português e Inglês) é não só um caminho por excelência para a valorização da herança linguística e cultural, como também acentua os seus potenciais benefícios futuros para as novas gerações, principalmente nos campos da educação e do trabalho. Por essa razão, o recentemente criado selo da CEP.CA contém um dístico latino ("ex familia verbum", da família vem a língua) que chama a atenção para a importância do papel da família e da comunidade no seu todo para o legado e manutenção da língua.


Neste âmbito vai ser lançado até final de Outubro de 2009 o primeiro Clube de Pais e Professores (presencialmente e na internet) que pretende estudar as questões do bilinguismo, trocar materiais, ideias e estratégias para utilizar na família e comunidade e promover a motivação para os jovens falarem mais Português entre si, com os adultos e online. Este modelo será estendido a todas as comunidades na Califórnia que mostrarem interesse em criar o seu próprio Clube.


III. PARTILHA


O desenvolvimento de uma cultura de colaboração entre todos os profissionais da educação é um dos grandes objectivos transversais da Coordenação. Dados os primeiros passos no ano passado, pretende-se avançar agora mais ágil e eficazmente na circulação, disseminação e partilha de recursos e materiais produzidos pelos próprios professores, os quais, publicados em suporte electrónico, poderão ser reutilizados e adaptados em diversos contextos de ensino (ver por exemplo PORTULAN 1 e PORTULAN 2).


Para além disto, com a recente aprovação dos novos World Language Content Standards pelo Departamento de Edução da Califórnia, pode-se avançar na criação de um currículo comum de trabalho para o EP no 1º, 2º e 3º ciclos do Ensino Básico. A partilha destes instrumentos de trabalho entre escolas de ensino público e comunitário, permitirá planear sequências mais longas de EP, desde o nível pré-escolar até ao secundário, ganhando o Português um prestígio consentâneo com o seu estatuto de língua global.


Assim, vai continuar a desenvolver-se a comunidade de aprendizagem e prática PORTULANO (Portuguese Language Network Online), centrada no desenvolvimento profissional e qualificação profissional e de programas, com presença na internet através de uma rede de sítios.

Embora estes projectos venham a ser posteriormente descritos em mais promenor, quem desejar informações adicionais pode enviar um email a Ana Cristina Sousa para acsousa@csustan.edu ou portulan.online@gmail.com.

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